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18 de novembro de 2025 04:34

Cooperativas de crédito avançam pelo Brasil e, no Nordeste, tornam-se ponte para a inclusão financeira

Cooperativas de crédito avançam pelo Brasil e, no Nordeste, tornam-se ponte para a inclusão financeira

Com presença crescente em cidades sem bancos e foco no desenvolvimento local, cooperativas de crédito ganham protagonismo no Nordeste, equilibrando sustentabilidade financeira e impacto social
Foto: Pixabay

Nos últimos anos, o cooperativismo de crédito vem se consolidando como uma alternativa concreta ao sistema bancário tradicional no Brasil. Com um modelo que prioriza o cooperado e não o lucro, essas instituições oferecem taxas mais acessíveis, promovem educação financeira e reinvestem seus resultados nas próprias comunidades. No Nordeste, onde a exclusão bancária ainda é uma realidade e o crédito produtivo escasso, o avanço das cooperativas representa um movimento de transformação econômica e social.

“O interesse crescente pelas cooperativas de crédito no Nordeste se explica pela combinação de inclusão financeira, presença física em cidades desassistidas por bancos tradicionais, taxas mais acessíveis e um modelo de relacionamento mais próximo e participativo com os associados”, resume o economista Fábio Leão, doutor em Sociedade, Tecnologias e Políticas Públicas (Sotepp/Afya).

Segundo ele, em mais de 200 cidades brasileiras, a única instituição financeira existente é uma cooperativa. No Nordeste, esse cenário se repete em centenas de municípios. “As cooperativas preenchem lacunas deixadas pelos grandes bancos, que vêm fechando agências físicas, especialmente em cidades pequenas”, explica. Mesmo com 96% das operações digitais, a presença física continua estratégica, funcionando como ponto de confiança e pertencimento para comunidades rurais e urbanas.

Um modelo moldado pela cultura local

A força do cooperativismo no Nordeste tem raízes profundas na cultura comunitária da região. “Há uma tradição de solidariedade e ajuda mútua que favorece o espírito cooperativo”, observa Leão. “Em muitas cidades pequenas, o vínculo pessoal entre cooperados e gestores é um diferencial frente aos bancos tradicionais.”

Essa proximidade é acompanhada de impacto concreto. Estudos da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) e da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) mostram que as cooperativas de crédito geram efeito positivo sobre o PIB local, a geração de empregos e a retenção de capital nas comunidades. “O modelo reinveste os recursos na própria região, fortalecendo cadeias produtivas e promovendo o desenvolvimento territorial sustentável”, completa o economista.

No campo econômico, as cooperativas se tornaram importantes vetores de inclusão financeira. Em áreas marcadas pela informalidade e pela ausência de crédito, o cooperativismo é a porta de entrada para o empreendedorismo. Linhas de microcrédito produtivo, apoio à agricultura familiar e estímulo à economia criativa são exemplos de atuação regionalizada.

O crescimento é acelerado, mas ainda desigual

De acordo com Cergio Tecchio, presidente do Sistema Oceb, o cooperativismo de crédito no Nordeste “tem se ampliado em alcance e relevância”, crescendo em ativos, carteira de crédito e número de associados. Dados do Panorama do Sistema Nacional de Crédito Cooperativo (SNCC) indicam que o número de cooperados na região aumentou 18,3% entre 2023 e 2024, com destaque para a expansão das pessoas jurídicas. Ainda assim, apenas 1,4% da população nordestina está associada a cooperativas de crédito, contra 24,6% no Sul, a região mais madura do país nesse segmento.

A Bahia lidera o movimento regional, com 15 cooperativas, 367 mil cooperados e R$ 5,5 bilhões em ativos. “Em muitos municípios baianos, a cooperativa é a única instituição financeira com atendimento presencial. Isso dinamiza as economias locais e desperta o interesse da população pelo cooperativismo de crédito”, destaca Tecchio.

O presidente lembra que esse avanço ocorre em meio a um processo de consolidação: “Temos crescimento em escala e capilaridade, mesmo com menos entidades, devido às incorporações. Isso demonstra maturação e fortalecimento do sistema”.

Desafios como digitalização, governança e inclusão marcam presença

Apesar dos bons resultados, o setor ainda enfrenta obstáculos significativos. Entre eles, a necessidade de maior inclusão digital, capitalização e engajamento dos cooperados. “A inovação e adoção de novas tecnologias definem quem permanecerá atuante no mercado”, afirma Tecchio. O Sistema Oceb tem estimulado o uso da plataforma InovaCoop, que promove capacitação e conecta cooperativas a temas como inteligência artificial, gestão de dados e negócios digitais.

Outro desafio é o equilíbrio entre a sustentabilidade financeira e o impacto social. Para Fábio Leão, “as cooperativas conseguem equilibrar eficiência operacional com foco comunitário, reinvestindo recursos localmente e oferecendo crédito acessível”. Ele lembra que 85% das cooperativas de crédito brasileiras reconhecem o valor estratégico das práticas ESG ( ambiental, social e de governança), o que reforça seu papel de agentes de transformação sustentável.

Mas o modelo democrático, baseado no princípio “um cooperado, um voto”, ainda convive com desigualdades internas. Perfis mais escolarizados e economicamente ativos ainda ocupam a maioria dos cargos de liderança. Mulheres, jovens e pequenos cooperados participam menos das decisões. Pesquisas da OCB indicam que apenas 18% dos cooperados participam regularmente das assembleias gerais.

A superação dessas barreiras, segundo o economista, passa por “educação cooperativista, incentivo à diversidade e uso de tecnologia para ampliar a participação remota”.

Entre a economia solidária e o sistema financeiro

O cooperativismo de crédito ocupa um espaço singular, pois nasce como instrumento da economia solidária, mas adota práticas típicas do sistema bancário tradicional para garantir a sustentabilidade. “É um equilíbrio delicado entre identidade e eficiência”, observa Leão. “As cooperativas precisam crescer e se digitalizar sem perder o propósito social que as diferencia dos bancos.”

Foto: Pixbay

Nesse sentido, exemplos como Sicredi Nordeste, Sicoob Sertão e Cresol ilustram o potencial transformador do modelo. No semiárido baiano, o Sicoob Sertão oferece microcrédito produtivo e capacitação de empreendedores. A Cresol atua em comunidades indígenas e quilombolas do Maranhão e Pará, enquanto o Sicredi Nordeste investe em educação financeira e formação de lideranças jovens.

Perspectivas para o futuro

O futuro do cooperativismo de crédito no Nordeste é promissor, mas depende da articulação entre governos, cooperativas e instituições de fomento. Para Tecchio, políticas públicas voltadas à desburocratização do acesso ao Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE), parcerias com Sudene, BNDES e Sebrae, e programas de educação financeira são essenciais para consolidar o setor.

“O cooperativismo de crédito é um aliado natural do desenvolvimento socioeconômico”, resume o presidente da Oceb. “Ele democratiza o acesso a serviços financeiros, gera emprego e renda, e materializa o princípio do interesse pela comunidade.”

Daieny Teixeira Guimaraes Gomes, Diretora de Negócios do Sicoob Nordeste, afirma que a transformação digital irá democratizar ainda mais o acesso aos serviços, mas o diferencial continuará sendo a presença local, a governança cooperativa e o atendimento próximo e humanizado. “Novas regulações tendem a exigir maior transparência e governança, algo em que o cooperativismo já tem forte vocação, e poderão abrir espaço para produtos e parcerias inovadoras. Estamos cada vez mais nos reinventando para cumprir as exigências dos órgãos reguladores, que são cada vez mais desafiadoras.”

Ao unir tradição comunitária, inovação tecnológica e propósito social, as cooperativas de crédito estão escrevendo um novo capítulo na história financeira do Nordeste, um capítulo em que o protagonismo é coletivo e o desenvolvimento, compartilhado.

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