As distribuidoras de gás do Nordeste enviaram, em abril, uma carta conjunta ao Ministério de Minas e Energia (MME) reivindicando a inclusão do gás natural e do biometano em uma política voltada aos data centers nas regiões Norte e Nordeste. O pedido foi formalizado durante uma reunião do Consórcio Nordeste em Salvador na última semana de março.

O que isso significa?
- As empresas Potigás, Bahiagás, Algás, Cegás, Copergás, PBGás e Sergás defendem a adoção dessas fontes para reduzir riscos operacionais dos data centers. A proposta tem como objetivo atrair mais investimentos, gerar empregos e impulsionar a inovação no Nordeste.
- Por outro lado, o aumento no uso do gás natural pode elevar os custos de energia, o que pode impactar a competitividade dos centros de dados, especialmente em um mercado global que cada vez mais prioriza fontes 100% renováveis.
- Data centers movimentam bilhões de reais e são peças-chave para o crescimento da economia digital, principalmente diante da expansão da inteligência artificial e da internet das coisas.
- Do ponto de vista ambiental, o biometano é considerado uma fonte renovável estratégica para a descarbonização. No entanto, a aposta crescente no gás natural — combustível fóssil — pode dificultar o cumprimento das metas de redução de emissões e atrasar a transição energética. Para Marina Melo, diretora-presidente da Potigás, o gás natural e o biometano são opções confiáveis como fontes de backup, garantindo previsibilidade e segurança no fornecimento de energia.
Por que essa demanda está em pauta?
Hoje, os data centers já respondem por cerca de 3% do consumo global de energia, e essa demanda tende a crescer de forma acelerada com o avanço da inteligência artificial e a informatização dos serviços. No Brasil, o modelo de autoprodução de energia, que acontece quando grandes consumidores financiam ou participam de usinas próprias, tem sido uma solução para baratear custos. Quando a energia gerada é solar ou eólica, há isenção de encargos como o de energia de reserva (EER) e o de serviço de sistema (ESS), o que pode representar uma economia de até 30% na conta de luz, tornando esse modelo ainda mais atraente para os data centers.
De acordo com dados da consultoria Clean Energy Latin America (Cela), dos 31 contratos de autoprodução firmados em 2024, 30 foram para data centers, totalizando 2,3 GW em capacidade, com predominância de energia solar e eólica. A ativista climática Jahzara Ona ressalta que o Brasil possui um “potencial natural e uma abundância de biodiversidade” que favorecem o desenvolvimento de diversas fontes renováveis.
Sobre a segurança energética para esses centros de dados, Fabio Morgado, diretor comercial da Algás, afirma que “o gás natural é o combustível com a maior confiabilidade e disponibilidade para as operações críticas como os data centers; não é por acaso que térmicas a gás são praticamente as únicas alternativas dos sistemas integrados em momentos de crise hídrica ou estabilização da sazonalidade das eólicas e fotovoltaicas”. Ele ainda destaca que, “com sua alta demanda de energia firme e renovável, os data centers podem impulsionar projetos de produção de biometano com melhor viabilidade econômica”.
Morgado também destaca o potencial do biometano como alternativa: “O biometano é um produto com grande potencial, como eventual substituto do gás natural fóssil, com aplicações já muito conhecidas em todos os segmentos. As principais dificuldades são decorrentes da produção ocorrer, na maioria dos casos, em locais distantes do consumidor final, exigindo o desenvolvimento de infraestrutura para seu transporte, uma regulação pouco desenvolvida buscando acelerar sua entrada no mercado, e ainda a falta de incentivos para sua produção.”
Ele conclui que “as operações dos data centers podem iniciar com o gás natural já disponível e migrar no tempo, a partir do desenvolvimento dos projetos para o biometano, assim temos projetos cada vez mais sustentáveis e com grande confiabilidade e segurança operacional.”
Segundo a consultoria Thymos, até 2026 o Brasil deve receber R$12 bilhões em investimentos em data centers. Atualmente, esses empreendimentos consomem cerca de 600 megawatts médios, mas o Ministério de Minas e Energia (MME) estima que a demanda máxima pode alcançar 9 gigawatts até 2035, com 22 projetos registrados em estados como São Paulo, Rio Grande do Sul, Ceará, Rio Grande do Norte e Bahia.
Quais são os principais desafios climáticos?
O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) projeta que a demanda de energia no Brasil chegará a 82,7 GW em 2025, o que representa um crescimento de 3,5% em relação a 2024.
A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) aprovou 12 projetos de hidrogênio verde em 2024 — um aumento de 50% em comparação com 2023.
Com a chegada do fenômeno La Niña, as chuvas devem aumentar no Norte e diminuir no Sul e Sudeste, o que pode agravar a seca e tornar os preços da energia ainda mais voláteis, principalmente pela incerteza sobre os níveis dos reservatórios hidrelétricos.
Políticas públicas e investimentos atuais
Em fevereiro, o Ministério da Fazenda incluiu a aprovação do marco legal da inteligência artificial e a criação de uma política para atrair data centers sustentáveis entre as prioridades do Plano de Transformação Ecológica.
No mesmo mês, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) anunciou R$ 500 milhões para o Programa Pró-Infra IA Sustentável, voltado à implementação de centros de dados com fontes de energia renováveis.
Para 2025, a expectativa é que o Brasil registre mais de 2 GW em contratos corporativos de compra de energia solar e eólica (PPAs), impulsionados pela demanda de setores como os próprios data centers e o hidrogênio.
Recapitulando
- Distribuidoras de gás do Nordeste pedem inclusão do gás natural e biometano em políticas para data centers, visando garantir estabilidade energética e atrair investimentos para a região.
- Data centers já consomem cerca de 3% da energia global e têm demanda crescente, impulsionada pela inteligência artificial e digitalização dos serviços.
- O modelo de autoprodução de energia renovável tem sido uma estratégia para reduzir custos, com possibilidade de economia de até 30% na conta de luz para esses grandes consumidores.
- O gás natural oferece confiabilidade essencial para operações críticas, enquanto o biometano aparece como uma alternativa renovável promissora, embora ainda enfrente desafios de infraestrutura e regulação.
- O Brasil deve receber R$12 bilhões em investimentos em data centers até 2026, com demanda projetada para crescer a até 9 GW até 2035, especialmente em estados como São Paulo, Ceará e Bahia.
- Entre os desafios climáticos, o aumento da demanda energética, os impactos do fenômeno La Niña e a volatilidade dos preços da energia são pontos que afetam a estabilidade do sistema elétrico.
Políticas públicas recentes incluem o marco legal para inteligência artificial e programas de incentivo a data centers sustentáveis, além do crescimento esperado em contratos de energia solar e eólica para 2025.