A chamada “economia do mar” — ou “economia azul” — começa a conquistar um espaço mais estruturado no debate sobre o desenvolvimento regional e nacional. Envolvendo desde a pesca até a produção de energia elétrica, passando por turismo, logística e exploração mineral, esse conjunto de atividades movimenta trilhões de reais e pode representar uma nova fronteira econômica para o Brasil, em especial para os estados do Nordeste.
“Os oceanos que cobrem mais de 70% do planeta são fontes de renda. O mar pode ser sonho de consumo nas férias, inspiração para poetas, mas também é economia”, afirma o economista Renan Laurentino, em conversa com o Investindo Por Aí. Segundo ele, o país ainda subestima o potencial dos mares como vetor de desenvolvimento. “Infelizmente o brasileiro ainda não enxerga a economia do mar, por exemplo, como enxerga a pecuária ou o agronegócio. A gente lembra sempre do veraneio, do turismo com hotéis e resorts, que sim, movimentam a economia nordestina. Mas há muito mais além disso”, completa.
A indústria pesqueira brasileira teve um crescimento significativo em 2024, com uma produção de mais de 960 mil toneladas de pescado — um aumento de 9,2% em relação ao ano anterior. Apesar disso, o país ainda ocupa a 28ª posição no ranking global de pesca e o 13º lugar na aquicultura. “São mais de um milhão de pescadores. Exportamos cerca de US$ 992 milhões em pescado neste ano. A gente leva pescado para o mundo, mas ainda há muito a melhorar para que essa atividade tenha maior representatividade na balança comercial”, pontua Laurentino.
No Nordeste, a economia do mar se manifesta em múltiplas frentes. Estados como Bahia e Rio Grande do Norte são produtores de petróleo e gás natural. O Rio Grande do Norte, por exemplo, responde por 95% da produção nacional de sal marinho. “Os portos da Bahia facilitam o comércio exterior e o abastecimento de produtos essenciais. A Bahia é fundamental para conectar o Brasil a mercados internacionais”, ressalta o economista.
A força da economia do mar também está nas rotas comerciais. Estima-se que 95% do que o Brasil exporta passa pelos mares. Apesar disso, Laurentino alerta para uma limitação estratégica: “A cabotagem, que é o transporte entre portos dentro do próprio país, é muito pouco explorada. Usamos iates e cruzeiros, mas não temos um sistema eficiente de transporte de passageiros entre cidades costeiras. Poderíamos ter viagens comerciais regulares entre Maceió, Recife, Salvador, Aracaju… Isso traria ganhos econômicos e logísticos”, continuou o especialista.
As perspectivas para os próximos anos são otimistas. Com investimentos em inovação, o País pode explorar novas formas de geração de energia, como o aproveitamento das ondas e marés. O planejamento marinho, defendido por especialistas, prevê a ocupação racional e sustentável da zona costeira até 2030. “Não se trata apenas de petróleo e gás natural. A economia do mar envolve pesca, turismo, transporte marítimo, exploração de recursos naturais e pesquisa científica”, explica Laurentino.
No entanto, o avanço da economia azul precisa caminhar lado a lado com a preservação ambiental. “Ainda agredimos muito os oceanos. Há lançamento indevido de água não tratada nas cidades litorâneas, poluição dos rios que desembocam no mar. Isso compromete os ecossistemas marinhos e coloca em risco toda a cadeia produtiva”, alerta o economista. Para ele, o desenvolvimento social e ambiental deve ser parte integrante do planejamento da economia do mar.
“Todo crescimento econômico tem impactos no meio ambiente, mas quando ele é bem planejado, esses impactos podem ser minimizados. A ideia é utilizar os recursos e as riquezas que o mar oferece de forma muito melhor e com mais consciência”, completa.
Enquanto países como os Estados Unidos já possuem planos consolidados para o uso sustentável da economia azul, o Brasil ainda precisa dar passos mais firmes nesse sentido. “Nos falta ainda esse olhar estratégico. O Nordeste tem uma costa muito bem visitada, explora bem o turismo, mas é preciso explorar mais — e melhor — as outras possibilidades que o mar oferece. Só assim vamos conseguir gerar mais emprego e renda a partir dessa imensa riqueza natural que temos à nossa disposição”, conclui Laurentino.
*Esta é a primeira matéria de uma série de quatro que o Investindo Por Aí publica a respeito da Economia do Mar