Nos últimos 20 anos, o Rio Grande do Norte permaneceu praticamente no mesmo patamar de participação no Produto Interno Bruto (PIB) nacional, com apenas 0,9%. Enquanto isso, vizinhos nordestinos como Ceará, Pernambuco e Piauí avançaram em industrialização, atração de investimentos e modernização de sua estrutura produtiva. O contraste expõe um quadro de estagnação econômica que ameaça a competitividade potiguar e pressiona por reformas estruturais urgentes.
De acordo com economistas, o problema não está na ausência de potencial, mas na dificuldade do Estado de transformar riquezas naturais em desenvolvimento sustentável. A economia potiguar segue apoiada em ativos como energia eólica, sal, petróleo, mineração e turismo, mas pouco avançou em diversificação industrial e inovação.
“O maior problema do Estado do Rio Grande do Norte é sua falta de capacidade própria de investimento”, resume Roberto Serquiz, presidente da Federação das Indústrias do RN (FIERN). Segundo ele, a folha de pagamento consome 72% da receita corrente líquida estadual, deixando pouco espaço para investimentos em infraestrutura e educação, bases indispensáveis para mudar o quadro.
Vizinhos avançam e RN fica para trás
Enquanto o RN se acomodou em crescimento modesto, estados vizinhos aplicaram reformas estruturais. O Ceará apostou em equilíbrio fiscal e em uma política industrial agressiva. O Piauí, até pouco tempo atrás considerado periférico na economia nordestina, conseguiu atrair indústrias de transformação e empresas de tecnologia, elevando sua taxa de crescimento acima da média regional.
Já o Rio Grande do Norte acumulou quatro governos consecutivos sem resolver o desequilíbrio fiscal, como lembra Serquiz: “A dificuldade fiscal do RN se arrasta há pelo menos três ou quatro governos sequenciais. Pernambuco teve a ação de Eduardo Campos, a Paraíba contou com Ricardo Coutinho, o Ceará com Tasso Jereissati. Aqui, seguimos sem fazer o dever de casa”, afirma.
O resultado aparece no comparativo de competitividade regional. O Ceará e Pernambuco, por exemplo, ampliaram sua participação no PIB nacional na última década. Já o Rio Grande do Norte segue estagnado em 0,9%.
Gargalos estruturais precisam de reformas urgentes
Além da questão fiscal, especialistas apontam outros entraves, como as estradas estaduais, que estão em condições ruins, o Porto de Natal, que perdeu competitividade, e a malha ferroviária, que segue praticamente inexistente. Isso encarece o escoamento da produção e limita a atração de indústrias.
Outro gargalo é a educação. O Estado encontra dificuldades na formação técnica e na qualificação de mão de obra. Especialistas afirmam que, sem mão de obra qualificada, o RN atrai apenas setores de baixo valor agregado, reforçando a dependência de comércio e serviços, e que é preciso alinhar educação profissional com vocações produtivas regionais.
O papel da FIERN e propostas em discussão
A FIERN tem buscado liderar uma agenda de modernização. Em abril de 2024, a entidade entregou ao governo estadual uma Agenda Propositiva que conta com um módulo regulatório com uma série de propostas de normas e legislações para a melhoria do ambiente de negócios do Estado. Nela, estava contida a proposta de Lei de Política Industrial; e também uma proposta de revisão de Lei Complementar 272/2004, que é a Lei Ambiental do Estado – o licenciamento ambiental é um dos pontos vitais para melhoria do ambiente de negócios, da segurança jurídica. “Defendemos, nesse ponto, maior autonomia para o órgão ambiental do Estado e descentralização para que os municípios possam ser responsáveis pelo licenciamento dos empreendimentos de menor porte”, afirma o presidente.
A FIERN entregou, ainda, uma proposta de recuperação de débitos da dívida ativa do Estado (transação tributária), já aprovada pela Assembleia Legislativa, contribuindo para a recuperação fiscal do Estado. Além disso, a Federação desenvolveu uma minuta da Lei das Parcerias Público Privadas, construída em diálogo com a Assembleia Legislativa, para criar outra opção para a atração de investimentos. “Todas essas sugestões do módulo regulatório estão em andamento, não na velocidade que gostaríamos, mas estão caminhando”, completa Roberto.
Serquiz acredita que a combinação dessas medidas pode abrir espaço para um novo ciclo de crescimento: “Está tudo diagnosticado. Agora é preciso ação. Ou fazemos uma reforma administrativa ampla, com pacto entre os poderes, ou vamos continuar remando contra a maré”, afirma.
Apesar da estagnação, RN tem potencial produtivo para se desenvolver
Mesmo com o cenário de estagnação, o RN possui setores capazes de puxar a diversificação produtiva. A indústria de transformação, praticamente esquecida nas últimas décadas, está no radar da FIERN.
Áreas como confecções, alimentos, móveis, indústria gráfica e cadeia do leite já dão sinais de vitalidade. No setor de energias renováveis, onde o Estado é líder nacional em eólica, há espaço para avançar para a indústria de equipamentos e componentes, agregando valor à produção.
“Nós temos diversas regiões, cada uma com seu potencial. Por isso que estamos chamando a atenção para o potencial de indústria de transformação, que foi esquecida por algum tempo. Aqui no RN temos um potencial e a FIERN está com projetos de fomento, de incentivo ao desenvolvimento da indústria de transformação – como é o caso do programa de Meritocracia Sindical, de incentivo ao crescimento sindical e à ação dos sindicatos”.
O Rio Grande do Norte vive uma encruzilhada. Ou rompe a inércia de duas décadas de crescimento modesto e avança em reformas estruturais, ou continuará perdendo espaço para vizinhos mais dinâmicos.
Para Roberto Serquiz, o recado é claro: “O RN depende dos seus ativos naturais, mas isso não basta. Precisamos de capacidade de investimento, ambiente de negócios favorável e política industrial para transformar riquezas em desenvolvimento.”
Enquanto isso, empresários e especialistas alertam: sem reformas urgentes em logística, educação e gestão fiscal, o Estado corre o risco de consolidar uma condição de estagnação econômica estrutural, com baixa competitividade e perda de oportunidades no Nordeste em transformação.