O Nordeste brasileiro vive um momento de inflexão em sua trajetória socioeconômica. Dados recentes mostram que a região conseguiu manter um ritmo sólido de crescimento econômico ao mesmo tempo em que avançou significativamente na redução dos índices de pobreza. O desempenho revela um quadro de mudanças estruturais, apoiadas em investimentos públicos e privados, diversificação produtiva e políticas de inclusão social, que recolocam o Nordeste no centro da agenda de desenvolvimento nacional.
No campo econômico, o Índice de Atividade Econômica Regional (IBCR-NE), calculado pelo Banco Central, apontou expansão de 2,4% no primeiro semestre de 2025. No acumulado de 12 meses, o crescimento chegou a 3,8%, quase em linha com a média nacional de 3,9%. A Bahia se destacou com avanço de 3,9% apenas nos seis primeiros meses do ano, resultado atribuído à diversidade produtiva e à força do agronegócio. No Ceará, o crescimento de 2,6% foi impulsionado por investimentos robustos em infraestrutura logística e energética. Segundo Marcos Falcão Gonçalves, gerente executivo do Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste (Etene), a sustentação desse dinamismo depende de acesso a crédito de longo prazo e de políticas que incentivem o investimento privado.
Nesse sentido, o papel do Banco do Nordeste (BNB) tem sido determinante. A instituição atua não apenas como financiadora, mas como estruturadora de condições que estimulam o desenvolvimento equilibrado. Projetos apoiados pelo banco em agropecuária, indústria e serviços produzem efeito multiplicador, gerando empregos, renda e oportunidades em territórios historicamente marcados por desigualdades. Esse movimento tem contribuído para reduzir fragilidades estruturais e fortalecer o tecido econômico regional, especialmente em períodos de instabilidade global.
Paralelamente, a Chamada Nordeste tornou-se um marco de articulação institucional para consolidar a base industrial da região. Lançada em maio, a iniciativa recebeu até agora R$ 16,5 bilhões em propostas, superando em R$ 6,5 bilhões a disponibilidade inicial de R$ 10 bilhões. A ação reúne Sudene, BNDES, BNB, Banco do Brasil, Caixa Econômica, Finep e o Consórcio Nordeste de Governadores, configurando o maior esforço conjunto já realizado para estimular a neoindustrialização regional. Entre as propostas apresentadas, destacam-se projetos em hidrogênio verde, data centers e energia renovável, áreas estratégicas para a transição sustentável da economia.
Segundo Francisco Alexandre, superintendente da Sudene, o Nordeste tem aproveitado oportunidades para atrair investimentos inovadores, alinhados à política industrial nacional. Além de setores ligados à transição energética, outros eixos prioritários incluem bioeconomia, com foco em fármacos, e indústria automotiva, especialmente na produção de máquinas agrícolas. A expectativa é que a seleção e formalização dos projetos seja concluída até janeiro de 2026, permitindo que, a partir daí, os investimentos se materializem em novas plantas, empregos qualificados e maior dinamismo econômico.
Diminuição da pobreza
Esse ambiente de crescimento tem produzido reflexos diretos sobre as condições sociais. Levantamento do Centro de Estudos para o Desenvolvimento do Nordeste, vinculado ao Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), revelou que entre 2022 e 2024 o Nordeste respondeu por 37,4% da redução da pobreza no Brasil. No período, 6,5 milhões de nordestinos ultrapassaram a linha de renda mínima definida pelo Banco Mundial, de R$ 696 per capita por mês. A região também concentrou 60,7% da queda da extrema pobreza nacional, com 3,1 milhões de pessoas deixando a condição de renda de até R$ 218 mensais.
A proporção de nordestinos abaixo da linha da pobreza caiu de 57,5% para 39,6% em apenas dois anos, uma redução de 17,9 pontos percentuais. Apesar da melhora, o índice permanece acima da média nacional, hoje em 23,4%, e apenas a região Norte apresenta situação comparável, com 37,3%. Isso demonstra que, embora os avanços sejam consistentes, ainda há um longo caminho para que o Nordeste alcance níveis de renda próximos ao restante do país.
A combinação de políticas de transferência de renda e aquecimento do mercado de trabalho foi decisiva nesse processo. A renda domiciliar per capita familiar média na região cresceu 20,2% no período, evidenciando o impacto tanto da valorização do salário mínimo e dos programas sociais quanto do dinamismo econômico local. Ainda assim, persistem desafios como a predominância de empregos informais, baixos índices de escolaridade e desigualdades estaduais: Maranhão e Ceará, por exemplo, ocupam as últimas posições no ranking nacional de renda familiar per capita.
O quadro, portanto, é de avanços expressivos, mas não definitivos. O Nordeste conseguiu provar que crescimento econômico e redução da pobreza podem caminhar juntos, desde que haja políticas consistentes de crédito, estímulo à inovação e redes de proteção social. O próximo passo será transformar esse ciclo positivo em base estrutural de desenvolvimento, capaz de enfrentar gargalos históricos e ampliar as oportunidades de inclusão produtiva.