Mais de um século após uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), o Ceará voltou a reivindicar parte do território atualmente sob domínio do Rio Grande do Norte. O foco da disputa é uma área de 734 hectares, próxima ao município de Tibau (RN), que o Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (Ipece) afirma pertencer ao estado cearense.
A tensão aumentou no dia 24 de abril, quando o governo do Ceará instalou uma nova placa de divisa em um ponto que, hoje, está sob controle potiguar. A reação foi imediata: a prefeita de Tibau, Lidiane Marques (União Brasil), ordenou a retirada da placa com apoio da polícia local. Em resposta, o Ceará mobilizou nova ação policial e reinstalou a sinalização em 8 de maio.
Ceará acusa “invasão progressiva” e contesta IBGE
Segundo o Ipece, houve uma “invasão territorial progressiva” por parte do município de Tibau, com construções de loteamentos, barracas e até escola em uma área de aproximadamente 495 mil m². Um estudo técnico com imagens de satélite aponta que a expansão urbana desde 2011 ultrapassou a linha de divisa estadual estabelecida pelo STF em 1920.
O governo cearense argumenta ainda que o traçado adotado pelo IBGE entre os Censos de 2000 e 2010 carece de respaldo legal. A Procuradoria-Geral do Estado do Ceará (PGE) validou o levantamento do Ipece, notificando oficialmente tanto o governo potiguar quanto a prefeitura de Tibau.
“A ocupação é não institucionalizada e sem respaldo legislativo”, afirma a nota técnica do Ipece. O órgão defende a legitimidade da nova marcação com base em mapas históricos, como o Atlas de 1933 e a Carta do Exército de 1970.
Rio Grande do Norte reage e pede diálogo
Do lado potiguar, a reação também foi firme. Além da retirada da placa por ordem da prefeita, a governadora Fátima Bezerra (PT) se reuniu com lideranças locais e criou um grupo de trabalho para defender o atual traçado da divisa. Tibau, que tem cerca de 5,3 mil habitantes, argumenta que presta todos os serviços públicos na área em disputa e cobra uma solução negociada.
“A nossa posição é clara: queremos um estudo conjunto e diálogo”, declarou a prefeitura.
O município também sustenta que há um histórico judicial favorável ao Rio Grande do Norte, destacando a atuação do jurista Rui Barbosa na defesa do território potiguar no início do século XX.
Crise política pode parar no STF
O conflito entre os estados, que até pouco tempo parecia restrito a um traço no mapa, agora ameaça se transformar em uma crise federativa. Com a área em disputa incorporando regiões de Icapuí e Aracati (CE), o caso tem potencial de escalar novamente ao STF.
Enquanto isso, moradores da chamada “Nova Tibau” vivem em meio à incerteza. A depender do desfecho, podem acordar cearenses sem sequer sair de casa.