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17 de maio de 2024 16:02

Coco salgado: Bahia perde espaço para produtos asiáticos e vê produção desabar

Coco salgado: Bahia perde espaço para produtos asiáticos e vê produção desabar

70% do coco ralado consumido no Brasil é importado, segundo Sindcoco

Um dos símbolos da agricultura baiana, a cadeia produtiva do coco está em crise. Ameaçado principalmente pela concorrência com o que é importado da Ásia, que tem preços mais baixos, investidores estão deixando de apostar no ramo e a produção do fruto não para de despencar. Em 2010, 623,6 milhões de cocos foram produzidos na Bahia. Já em 2019, foram apenas 333,7 milhões, segundo dados mais recentes do IBGE.

A fazendeira Fernanda Tarini, 72 anos, foi uma das que desistiu. Em 2013, ela tinha feito um empréstimo bancário para reformular sua plantação na cidade de Conde, Litoral Norte, e passar a produzir o coco seco, utilizado para fazer o coco ralado. Em 2015, a entrada do coco asiático aconteceu com mais força no mercado brasileiro e seus consumidores passaram a optar pelo produto importado, que é mais barato.

“As fábricas que compravam coco seco da gente ou deixavam de comprar ou deixavam de existir. Se elas comprassem da gente, não iam conseguir concorrer com os preços que vinham de fora”, diz Fernanda, que ainda passou quatro anos tentando manter a fazenda, até decidir fechar as portas em 2019. “Hoje, negocio com o banco e estou vendendo o espaço. Me mudei para São Paulo e não quero mais essa vida”, afirma, sem deixar de reconhecer que essa foi uma das fases mais difíceis de sua vida.

Fernando Florence, agricultor baiano há mais de 40 anos e vice-presidente do Sindicato Nacional de Produtores de Coco (Sindcoco), explica o motivo do coco importado ser mais barato.

“Na Ásia, o coco não é um alimento. Eles aproveitam o óleo e fazem uma jogada não muito leal, pois o coco chega aqui com apenas 25% de gordura. Já o produto nacional tem 65% de gordura, ou seja, é de mais qualidade. Lá o custo de produção é mais baixo, os salários são menores e, inclusive, a colheita é feita por macacos, não há custos”, aponta.  

A importação de coco ralado cresceu cerca de 20% em 2019, no Brasil. (Foto: Sindcoco)

 

Água de coco também é impactada com importação 

O especialista também afirma que o problema tem reflexos na produção de água de coco. É que o Brasil importa da Ásia a chamada “água de coco concentrada”, que é obtida a partir do resíduo do coco seco e é considerado de baixo valor. Lá, este líquido é desidratado e transformado em uma espécie de geleia, para facilitar e baratear o transporte no momento da exportação. No Brasil, ela é misturada com água potável ou água de coco natural, e passa a ser chamada de “água de coco reconstituída”.

“Tem muitas caixinhas de água de coco sendo vendida no mercado que são reconstituídas e, na minha opinião, isso não é água de coco de verdade, mas o consumidor pensa que é. Trata-se de um produto sem qualidade e não saudável. A gente que faz um bom trabalho concorre com aquilo”, lamenta o jornalista e empresário Jony Torres, dono da Água de Coco Beira Mar. Ele acredita que, se não fosse essa realidade, venderia 30% a mais do que atualmente.

“A solução para o consumidor é procurar a chamada água de coco integral, que já vem envasada por uma empresa credenciada no Ministério da Agricultura. Felizmente, eu forneço para pessoas que gostam e conhecem um produto de qualidade. Esse público não compra de caixinha, mas a gente perde um consumidor que se engana com o que vê no mercado”, diz.

Presidente da Associação Nacional dos Produtores de Coco (Aprococo), Reinaldo Nascimento diz que a entidade surgiu justamente para entender porque a coconicultura está sendo inviabilizada no Brasil, como ele mesmo diz. “E a Bahia é impactada, pois era a maior produtora disparada e tinha muitos hectares para cultivo. Hoje, já fomos ultrapassados pelo Ceará nisso. Há ausências de políticas públicas para o nosso setor”, lamenta.

Segundo o presidente do Sindcoco, Francisco Porto, a entidade está lutando para que o coco ralado importado seja obrigado a ter 65% de gordura, como é o caso dos produtos nacionais.

“Assim a concorrência não vai ficar desleal. Hoje nós importamos 70% do consumo aparente de coco ralado. Já a água de coco a gente consegue ainda exportar, mas 70% do nosso desempenho é do Ceará. A Bahia é muito pouco nisso”, afirma.

O Brasil apresentou, em 2019, segundo o IBGE, 186.950 hectares cultivados com coqueiro, distribuídos, praticamente, em quase todo o território nacional com produção equivalente a 1.553.966 de frutos. Dentre as principais regiões brasileiras produtoras, o Nordeste destaca-se, produzindo cerca de 73% de toda a produção nacional.

Área ocupada pelos coqueirais na Bahia foi reduzida pela metade. Muitos agricultores estão trocando o cultivo por outras frutas ou investindo no sistema consorciado com a pecuária (Foto: Georgina Maynart/Arquivo CORREIO)

Seagri afirma que cultura do coco gera ainda 240 mil postos de trabalho na Bahia 
De acordo com a Secretaria da Agricultura, Pecuária, Irrigação, Pesca e Aquicultura (Seagri), a cultura do coco ocorre no Litoral Norte e Agreste Baiano, locais com muita insolação, chuvas regulares e terrenos arenosos ideais para o cultivo da lavoura, podendo ampliar seu cultivo em áreas irrigadas. “Há ainda duas regiões onde a coconicultura é relevante: os perímetros irrigados de Rodelas e Juazeiro – na região do São Francisco -, e a Costa Litorânea do Baixo Sul e Sul da Bahia entre Ilhéus e Belmonte”, disse, em nota.

Para a pasta, o agronegócio do coco tem grande importância socioeconômica para a Bahia, visto que o estado ainda figura como maior produtor nacional e 240 mil postos de trabalho vêm da área. “A expansão da demanda nacional e mundial por derivados de coco, sobretudo da água, representa uma oportunidade interessante para atração de agroinvestimentos nesta cadeia produtiva”, informam.

A Seagri também destaca que a cultura do coco permite que sua produção seja consorciada com outras culturas e com criação de animais. “Espera-se que os números subam no estado para as safras 2020 e 2021, em função das melhores condições climáticas. Espera-se que a área colhida de coco e produção aumentem, impulsionado pela procura por alimentos naturais e saudáveis, uma vez que o mercado aponta, principalmente, para o aumento da demanda por alimentos mais saudáveis, seguros e nutritivos”, conclui a pasta.

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