O etanol de segunda geração (2G), também conhecido como etanol celulósico, é uma inovação significativa no campo dos biocombustíveis. Produzido a partir dos açúcares contidos na celulose de resíduos agrícolas, o etanol 2G não compete com a produção de alimentos; ao contrário, ele aproveita resíduos agrícolas e biomassa, o que potencialmente aumenta a receita por hectare para os produtores e proprietários de terras.
O que é etanol 2G?
Diferentemente do etanol convencional, produzido a partir da sacarose do caldo de cana ou milho, o etanol 2G é derivado dos açúcares na celulose e hemicelulose de resíduos agrícolas e biomassa, como madeira, bagaço e palha. Este etanol utiliza xilose e glicose, quebrados por um processo complexo de pré-tratamento e fermentação.
O principal benefício do etanol 2G é que ele não compete com alimentos, aproveitando resíduos agrícolas que seriam descartados. Isso maximiza o uso dos recursos disponíveis e reduz as emissões de carbono.
Embora sua estrutura molecular seja idêntica à do etanol convencional, o etanol 2G pode emitir significativamente menos carbono, sendo uma alternativa mais sustentável e, em muitos casos, podendo ser considerado Net Zero, como o etanol da GranBio.
Avanços tecnológicos e potencial de produção
A GranBio, pioneira na produção de etanol 2G no Brasil, utiliza dois processos proprietários: o GreenPower + (GP+) e o AVAP. Ambos os métodos começam com a quebra das paredes celulares da biomassa (da madeira, bagaço, palha ou outras biomassas), utilizando uma combinação de temperatura, pressão e solventes para expor as moléculas de celulose e hemicelulose. Em seguida, enzimas específicas convertem essas moléculas em açúcares, que são fermentados e destilados para produzir etanol.
O potencial de produção de etanol 2G no Brasil é impressionante. Com cerca de 140 milhões de hectares de pastagem ou áreas degradadas, o Brasil tem uma enorme capacidade de expandir a produção de etanol sem necessidade de novos hectares de terra. Se toda a palha de cana deixada no campo fosse convertida em etanol celulósico, o país poderia aumentar sua produção em 50%. Além disso, se metade da área degradada fosse utilizada para a produção de etanol 2G, o Brasil poderia substituir toda a gasolina consumida globalmente.
Por que Alagoas?
A escolha de São Miguel dos Campos, em Alagoas, pela GranBio para sediar sua planta industrial e estação experimental deve-se a diversos fatores estratégicos. Em 2011, quando a companhia foi fundada, a GranBio buscava uma região que pudesse fornecer um parceiro de primeira geração, disposto a correr riscos na integração de operações.
A parceria com o Grupo Carlos Lyra, com sua afinidade empresarial pela inovação, foi um ponto crucial para a decisão, como conta Bernardo Gradin. Além disso, a proximidade com unidades existentes de etanol de primeira geração otimiza o uso de palha, cana e bagaço, essenciais para a produção da GranBio.
“A escolha de Alagoas também foi influenciada pela localização estratégica do porto, que facilita a exportação tanto para os Estados Unidos quanto para a Europa, além de um ambiente institucional que estimula a inovação”, destacou Bernardo Gradin, CEO da GranBio.
A infraestrutura portuária eficiente, a apenas 40 km da planta, oferece uma vantagem comparativa significativa para a exportação. Além disso, Alagoas mostrou-se proativa e flexível em relação à regulamentação de novos produtos e incentivos fiscais, criando um ambiente propício para o desenvolvimento e sucesso de novas indústrias. Essa cultura de inovação e suporte institucional solidificou a decisão da GranBio de investir na região.
Novas estratégias e ampliação de produção
Após registrar um prejuízo de R$171 milhões em 2021 e um lucro de R$26 milhões em 2022, a GranBio enfrentou novas dificuldades financeiras em 2023, com um prejuízo líquido acumulado que alcançou R$758,86 milhões. No último ano, a empresa teve perdas de R$74,33 milhões, revertendo o lucro obtido anteriormente, conforme relatório.
Para enfrentar esses desafios e buscar uma recuperação financeira, a GranBio contratou uma empresa de engenharia especializada em janeiro de 2023. O objetivo é desenvolver um projeto para aumentar a capacidade produtiva da planta Bioflex de 30 milhões para 60 milhões de litros por ano até 2026 e, potencialmente, para 200 milhões de litros por ano a partir de 2027. Este projeto incluirá a combinação de etanol de segunda geração (2G) e de primeira geração (1G) produzido a partir de melaço residual.
Para Bernardo Gradin, CEO da GranBio, o grande ponto é avaliar o valor do risco de ser pioneiro em tecnologia e de posicionar um projeto à frente do mercado. “Recentemente, reestruturamos nossa instalação industrial em Alagoas, aumentando o investimento para adaptar a biorefina. Agora, além de utilizar palha de cana, também convertemos melaço residual em etanol. Embora não seja considerado etanol 2G, o produto tem uma pegada de carbono quase neutra”, relata.
A partir da produção de etanol, é gerada a vinhaça, um resíduo líquido derivado da destilação do vinho obtido da fermentação do caldo da cana-de-açúcar ou melaço. Após ser concentrada por um evaporador, a vinhaça será convertida em biogás com uma pegada de carbono praticamente neutra.
“Essa integração da cadeia produtiva permite aproveitar ao máximo os resíduos, gerando valor agregado tanto para os produtores locais quanto para o estado de Alagoas e o Nordeste”, afirma Gradin. “A colaboração com produtores locais e a criação de uma nova linha de negócios, o biogás, contribuem para a redução significativa das emissões e promovem uma pegada verde importante para a região”, complementa.
Pré-venda de etanol como uma tática para antecipar receitas e melhorar a gestão do capital de giro
Além disso, a GranBio está em negociações para contratos de pré-venda de etanol como uma estratégia para antecipar recursos e otimizar seu capital de giro. O objetivo é que a antecipação dos recursos obtidos com as pré-vendas de E2G financie o investimento planejado há algum tempo pela empresa, visando expandir a capacidade da Bioflex de 30 milhões para 50 milhões de litros anuais.
A longo prazo, a estratégia inclui a produção de combustível sustentável de aviação com pegada neutra de carbono (NET ZERO SAF). A empresa receberá um subsídio de US$80 milhões para acelerar o desenvolvimento da tecnologia.
“Tenho uma expectativa elevada para o etanol celulósico no mercado de SAF. A política pública americana exige um baixo nível de captura de carbono para conceder subsídios a esses combustíveis, e apenas o etanol celulósico atende a esses requisitos. Vejo a descarbonização da aviação como um novo mercado promissor para o etanol celulósico, e estimo que precisaremos de 3 a 4 anos para que esse mercado se concretize”, destaca Gradin.
Expectativas de lucratividade e perspectivas futuras do Etanol 2G
As expectativas de lucratividade para o etanol de segunda geração (2G) estão diretamente ligadas às dinâmicas do mercado global e às políticas públicas por questões de segurança energética.
O CEO da GranBio, comenta sobre suas expectativas: “A guerra na Ucrânia impactou significativamente o cenário europeu, reduzindo os preços do etanol celulósico de cerca de 1.500 dólares por tonelada para aproximadamente 900 dólares, se aproximando do preço do etanol comum. Se a guerra não durar mais um ano, acredito que no final do próximo ano o mercado europeu oferecerá um preço adequado e mais atrativo para o etanol celulósico”.
No Brasil, no entanto, o cenário ainda não é tão promissor devido à falta de políticas públicas que compensem os custos de produção do etanol celulósico. Por isso, a GranBio está explorando diversificações como biogás e hidrogênio verde para maximizar o uso de suas instalações de ponta e revitalizar seus investimentos.
Investidores e parcerias
Ao formar alianças estratégicas, empresas podem alavancar recursos, compartilhar conhecimentos e criar soluções mais sustentáveis. Por exemplo, a integração de cadeias produtivas e o desenvolvimento de tecnologias limpas são facilitados por parcerias que visam não apenas lucro, mas também impacto ambiental positivo. Tais colaborações permitem a criação de produtos inovadores e a ampliação do mercado, o que, por sua vez, atrai mais investimentos e fortalece o setor.
Como destacou Bernardo Gradin, CEO da GranBio: “Hoje, estamos em fase de negociação com importantes parceiros para a utilização do biogás e do CO2 verde em novos produtos, como refrigerantes e cervejas. Isso não apenas demonstra a viabilidade de nossos investimentos, mas também evidencia nosso compromisso em transformar a cadeia produtiva para uma maior sustentabilidade. A integração de produtores de açúcar e etanol ao nosso modelo cria uma rede virtuosa que reduz a pegada de carbono e promove a inovação”.