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16 de maio de 2024 12:57

Com Brasil em recessão técnica, dois economistas respondem a 5 perguntas sobre o que esperar do futuro

Com Brasil em recessão técnica, dois economistas respondem a 5 perguntas sobre o que esperar do futuro

Em comum, os economistas Eduardo Giannetti e Zeina Latif avaliam que as incertezas fiscal e política dificultam uma melhora do cenário econômico do Brasil no curto prazo

Por Luiz Guilherme Gerbelli
Para o g1

O resultado do Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre – que caiu 0,1% e colocou o país em recessão técnica – não deixa dúvidas de que a economia brasileira perdeu fôlego. E um alívio não deve ocorrer tão cedo. Em comum, os economistas Eduardo Giannetti e Zeina Latif avaliam que as incertezas fiscal e política dificultam uma melhora do cenário econômico do Brasil no curto prazo.

Nesta reportagem, os dois economistas respondem em cinco perguntas o que esperam para os próximos trimestres. Leia as entrevistas abaixo:

Eduardo Giannetti

‘Herança para o próximo governo vai ser complicada’, diz Giannetti

O economista Eduardo Giannetti afirma que o Brasil enfrenta um quadro social “dramático” dado o elevado desemprego, sobretudo, entre os mais pobres. Ele também avalia que o “país desmontou o que restava das instituições de controle fiscal” e que a crise institucional provocada pelo presidente Jair Bolsonaro inviabiliza investimentos de longo prazo no país.

A seguir, os principais trechos da entrevista concedida ao g1.

Retrato do economista Eduardo Giannetti — Foto: Evelson de Freitas / Estadão Conteúdo / Arquivo

Qual é o cenário atual da economia?

Me chama a atenção que temos dois pares que raramente caminham juntos. O primeiro é inflação alta com economia estagnada. O Brasil está vivendo uma estagflação. A inflação acumulada está acima de dois dígitos, e o crescimento sofreu uma forte desaceleração na segunda metade de 2021. É pouco comum ter inflação tão alta com crescimento tão baixo.

“A segunda combinação bastante incomum na experiência brasileira é que estamos vivendo um momento de forte valorização nos preços das commodities e, ao mesmo tempo, uma fortíssima desvalorização do real em relação ao dólar. Esses dois movimentos, normalmente, são combinados de outra maneira. Quando as commodities se valorizam, o real se aprecia”.

O que explica parte desse cenário?

A minha interpretação é que existem dois motivos fundamentais pelos quais o real se desvalorizou tanto: a incerteza fiscal e a incerteza político-institucional, que afugentou muitos investidores do Brasil e retraiu demais os investimentos.

O problema fiscal se agravou recentemente com as medidas que o governo aprova no Congresso, de institucionalização do calote pela PEC do Precatórios e pela gambiarra da mudança no indexador do teto de gastos. O Brasil desmontou o que restava das instituições de controle fiscal. Ao mesmo tempo, o ruído político-institucional criado pelo presidente Jair Bolsonaro, que adota a estratégia de conflito, prejudica muito a previsibilidade e a tranquilidade que o país precisa para poder fazer os investimentos de longo prazo.

E como fica a economia em 2022?

Se não houver uma recessão, o Brasil vai ficar numa situação muito próxima disso. O quadro social é dramático, com o desemprego altíssimo. E nós estamos assistindo a um fenômeno extremamente preocupante e cruel. O emprego voltou para a população economicamente ativa de maior escolaridade, mas não voltou para os brasileiros com menos escolaridade. E esse é um fato que agrava demais a desigualdade no Brasil e que leva a uma situação de privação material para milhões de brasileiros.

O que dá para esperar até a chegada do novo governo, seja qual for o resultado?

Eu acho que 2022 vai ser um ano de alta volatilidade, um pouco parecido com o que precedeu a posse do Lula no primeiro mandato, quando nós tivemos uma forte desvalorização do real, que chegou a R$ 4 naquele momento – hoje, seria o equivalente a R$ 7. Não me surpreenderia ver isso acontecendo ao longo do período pré-eleitoral.

“A herança para o próximo governo, seja qual for, vai ser muito complicada. Vai exigir muita credibilidade do novo governo para ele conseguir reverter esse quadro de juro alto, baixo investimento e crescimento, câmbio depreciado, alto desemprego. Vai precisar ter muita credibilidade”.

Dado esse quadro social dramático, quando a vida das pessoas vai melhorar?

Se tiver o próximo governo tiver credibilidade, realmente conseguir convencer com ações de que colocou o país num bom caminho, especialmente na área fiscal, eu acredito que haverá uma reversão grande desses movimentos de desvalorização da moeda e dos ativos denominados em real. Isso contribui para diminuir a inflação. Eu acho que a vida começa a melhorar.
Esse caminho também deve promover uma retomada dos investimentos. Tem muitos projetos que estão em compasso de espera. Os novos marcos regulatórios brasileiros, do saneamento, da infraestrutura ferroviária, da infraestrutura portuária têm condição de atrair grande investimento externo relevante. Mas isso não vai se materializar enquanto o horizonte brasileiro não estiver mais claro, e isso só vai acontecer depois das eleições.

Zeina Latif

‘Bolsonaro está entregando um país pior do que recebeu’, diz Zeina

A economista Zeina Latif afirma a economia brasileira está estruturalmente mais frágil. Hoje, ela diz que o país tem um potencial de crescimento “muito baixo” e mais dificuldade para corrigir erros cometidos na política monetária. Para 2022, avalia que o Brasil deve enfrentar um quadro recessivo.

A seguir os principais trechos da entrevista concedida ao g1.

Economista Zeina Latif — Foto: Marcelo Brandt / G1

Qual é a situação da economia brasileira?

A economia está estruturalmente mais frágil do que no passado. Já existiam sinais importantes de baixo crescimento antes da pandemia. E no pós-pandemia, a gente está falando de um país com aumento da chamada taxa de desemprego estrutural, natural. Há um contingente enorme de pessoas sem qualificação para entrar no mercado de trabalho, que hoje é mais exigente. Algumas ocupações e serviços básicos, que acabam sendo a porta de entrada no mercado de trabalho, desapareceram ou encolheram muito. Com isso, o nosso potencial fica muito limitado.

Qual é a consequência desse cenário de potencial limitado?

Um país com potencial de crescimento muito baixo é mais sensível a erros de política econômica como os que vemos agora. É muito mais difícil a correção de rumo. Você não consegue abrir o jornal e não ver uma notícia ruim sobre a questão fiscal. É uma atrás da outra. E não se trata apenas de gastar. A gente está falando de retrocesso institucional, estamos vendo a discussão no Congresso sobre a regra do teto. O ambiente macroeconômico está começando a ficar muito parecido com o final do governo Dilma Rousseff. Todo o quadro é muito ruim. Não vai ser fácil consertar.

É possível aprovar alguma reforma importante até o fim do governo Bolsonaro?

Deixou de ser uma questão do que pode ser aprovado. O Congresso está tomando medidas irresponsáveis do ponto de vista fiscal. É melhor não aprovar mais nada. Cada um está olhando para a sua competitividade nas eleições, todo mundo querendo ter o Auxílio Brasil para chamar de seu. E a política econômica foi praticamente terceirizada. Não tem o governo cuidando da agenda legislativa. Há temas importantes que estão saindo ali, e a gente não vê a presença do governo para falar o que não faz sentido. Faz falta um presidente da Câmara que consulte mais, dialogue mais, entenda mais tecnicamente aquilo está saindo. Sinto falta de um zelo maior em relação a isso.

“Está muito claro que Bolsonaro está entregando um país pior do que recebeu. Você pode falar que tiveram algumas reformas importantes, e é verdade. Mas, do ponto de vista de ambiente macroeconômico, de ambiente institucional, eu vejo retrocessos”.

Uma agenda de reformas no próximo governo traz uma retomada rápida ou estamos fadados a anos de baixo crescimento?

O próximo presidente precisa vir com uma clareza da agenda econômica e com força política para, no primeiro ano de governo, avançar com temas mais polêmicos e sinalizar o seu compromisso com a disciplina fiscal, qualquer que seja o teto. Eu acho que não deveria mexer com o teto, mas, digamos que se conclua que vai mexer na regra, a questão é sinalizar o compromisso com a disciplina fiscal. Aí acho que a gente tem rápido uma descompressão nas expectavas de inflacionárias e no câmbio.

Mas precisa ter clareza de agenda e força política. Não adiante falar que vai fazer. Espero que uma lição que se tenha aprendido é que não se trata de colocar um ministro da Fazenda, da Economia, com visão dos problemas. São agendas que dependem de apoio político. O presidente tem de estar envolvido. Não adianta chegar e falar: ‘isso daqui é assunto do ministro da Economia, não é comigo’. Isso não existe. É incompreensível o mercado ter caído nesse tipo de conversa, ainda mais depois de ter passado pela experiência do Joaquim Levy (ministro da Fazenda no início do segundo governo Dilma Rousseff), em que ele não conseguiu implementar aquilo que queria.

O país vive um quadro social muito difícil. O que dá para esperar do emprego?

A tendência do desemprego é aumentar no ano que vem por causa de todo o impacto da alta de juros. Tem uma inflação muito teimosa, e eu acho que o Banco Central vai ter muita dificuldade para fazer a inflação cair. Eu acho otimista essa previsão do mercado de (queda do IPCA) de 10% ir para 5% no ano que vem. A inflação alta é mais rígida também. E o BC está sozinho, enxugando gelo. É um quadro difícil. Sem contar a espera provocada pela incerteza política (com a eleição). A gente vê sinais das empresas aguardando para contratar e investir. Temos visto essas revisões de projeções do PIB para 2022. Eu acho que o ano que vem será de um quadro recessivo. Já é uma economia fraca e tem ainda todo o efeito para se materializar de alta da taxa de juros.

“Temos visto essas revisões de projeções do PIB para 2022. Eu acho que o ano que vem será de um quadro recessivo. Já é uma economia fraca e tem ainda todo o efeito para se materializar de alta da taxa de juros”.

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