A construção de espigões no Litoral Norte de Maceió tem preocupado especialistas em meio ambiente e urbanistas desde a construção das primeiras torres nas areias de Guaxuma. Apesar dos questionamentos da população e dos impactos ambientais e urbanísticos, o promotor de Justiça Jorge Dória, titular da 66ª Promotoria de Justiça da Capital, explicou ao Investindo Por Aí que a liberação de prédios de 20 andares na região acontece porque o Plano Diretor da capital está desatualizado há quase duas décadas.
“Não se trata de ir contra a legislação vigente, mas de reconhecer que estamos operando sob um Plano Diretor de 2005, que deveria ter sido revisto em 2015 e até hoje não foi atualizado”, explicou o promotor em entrevista à reportagem.
Segundo o membro do Ministério Público, a falta de um diagnóstico atualizado sobre os impactos ambientais, urbanísticos e de infraestrutura tem permitido a aprovação de novos empreendimentos sem considerar os efeitos cumulativos dessas construções. “O que o Ministério Público Estadual de Alagoas está recomendando é uma pausa nessas liberações até que o Plano Diretor seja revisado. A previsão é que ele chegue à Câmara de Vereadores até a metade de 2025, mas até lá é preciso prudência”, reforçou.
Para Jorge Dória, a falta de um planejamento urbano atualizado pode gerar impactos irreversíveis para a região. “Quando se ergue um edifício de 20 andares, não estamos falando apenas da estrutura em si, mas do aumento populacional, da necessidade de saneamento, mobilidade e de outras infraestruturas que precisam acompanhar esse crescimento. Sem um Plano Diretor atualizado, não há garantias de que a cidade terá suporte para esse adensamento populacional”, alertou.
Ele destacou ainda que, em outras regiões do Brasil, cidades que permitiram a verticalização desordenada sem planejamento enfrentam problemas como congestionamentos crônicos, sobrecarga em redes de esgoto e abastecimento de água, e perda da identidade paisagística. “Basta olhar o que aconteceu em Stella Maris, que era um bairro de casas e passou por um boom imobiliário desordenado. Hoje, além dos congestionamentos constantes, a infraestrutura sofre para atender a nova demanda. Queremos evitar que esse mesmo cenário se repita em outras áreas da cidade”, exemplificou o promotor.
Brasken
Outro ponto abordado na recomendação do MP Estadual diz respeito às consequências da extração de sal-gema pela Braskem, que levou ao afundamento de bairros inteiros em Maceió. Jorge Dória esclareceu que o acordo socioambiental firmado entre a empresa e a Prefeitura não prevê a construção de novos empreendimentos nas áreas atingidas pela mineradora. “Primeiro, o solo precisará ser estabilizado e receber cobertura vegetal. Só então, com a revisão do Plano Diretor, poderemos definir o destino dessas regiões”, pontuou.
A recomendação do MP/AL, assinada por Jorge Dória e pelos promotores Paulo Henrique Prado e Kleber Valadares, fixou um prazo de 10 dias, a partir de 20 de fevereiro, para que a Prefeitura de Maceió se manifestasse sobre a questão. Caso a gestão municipal não adote providências, o Ministério Público estuda acionar a Justiça para garantir que as liberações sejam suspensas até a conclusão do novo Plano Diretor.
Primeiro semestre
A Prefeitura de Maceió informou ao portal que a revisão do Plano Diretor está em fase final dentro do Executivo Municipal. Segundo a gestão, a equipe técnica está finalizando os ajustes na minuta do texto, que será enviado para análise e votação na Câmara de Vereadores ainda no primeiro semestre de 2025.
Sobre os bairros afetados pelo afundamento do solo, a Prefeitura explicou que o Plano Diretor aborda a questão dentro das diretrizes urbanísticas e ambientais, criando a chamada Zona de Monitoramento e Reparação. “A gestão reitera o compromisso com um processo participativo e transparente, garantindo que todas as informações e documentos estão disponíveis no site oficial do Plano Diretor”, diz a nota.
Audiência pública debate impacto ambiental de novos empreendimentos na Lagoa da Anta
A Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa de Alagoas realizou na última semana uma audiência pública para discutir a preservação da Lagoa da Anta, no bairro da Jatiúca, e os impactos ambientais da construção de cinco empreendimentos na região. O presidente da Comissão, deputado Delegado Leonam (União Brasil), destacou que o encontro buscou ouvir comunidade, ambientalistas, especialistas, setor imobiliário e poder público antes de qualquer tomada de decisão.
“A urbanização traz oportunidades de crescimento, mas também exige planejamento responsável, respeito ao meio ambiente e atenção à qualidade de vida da população. A Lagoa da Anta é o último resquício de bacia d’água em zona urbana de Maceió, e temos o dever constitucional de preservá-la”, afirmou Leonam ao Investindo Por Aí.
O diretor da empresa Record Construtora, Hélio Abreu, explicou que a empresa negocia a aquisição do Hotel Jatiúca e que pretende desenvolver um projeto para revitalizar o hotel e complementar o empreendimento com infraestrutura urbana adequada. “Posso garantir que esse projeto ainda não existe fisicamente. Estamos montando um grupo de profissionais para desenvolver um plano que atenda os anseios da sociedade”, disse Abreu.
O promotor Paulo Henrique Prado garantiu que o Ministério Público acompanhará todo o processo. “Nosso dever é garantir que a cidade esteja apta não apenas para os moradores atuais, mas também para as futuras gerações”, afirmou.
O diretor-executivo do Instituto do Meio Ambiente de Alagoas (IMA), Ivens Leão, reforçou que em 2023 o órgão notificou o Hotel Jatiúca, a Record Construtora e a Prefeitura de Maceió sobre a necessidade de apresentar um projeto formal para avaliação ambiental. “O estudo de impacto ambiental é essencial para qualquer liberação de licenciamento na área”, pontuou Leão.
Representantes de diferentes órgãos e instituições participaram da audiência, incluindo o Conselho Regional de Corretores de Imóveis, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/AL), Conselho de Arquitetura e Urbanismo, Instituto de Arquitetura do Brasil, além de ambientalistas e moradores da região. A Comissão de Meio Ambiente prometeu reunir os dados apresentados para avaliar soluções equilibradas que garantam a preservação ambiental e o desenvolvimento urbano de forma sustentável.