Resistência a doenças, menos defensivos no campo e uma fibra fina e longa capaz de competir com o algodão importado do Egito. Com essas promessas, duas novas cultivares lançadas pela Embrapa Algodão, em parceria com a empresa Lyntera, acendem o alerta para uma possível virada na cotonicultura do Nordeste, região historicamente afetada por pragas e limitada a mercados de menor valor agregado.
As novas cultivares transgênicas de algodão BRS 700FL B3RF e BRS 800 B3RF prometem uma revolução na produção do Nordeste. Com fibras longas e fino acabamento, além de resistência superior a pragas e doenças, elas surgem com potencial de reduzir custos, ampliar a sustentabilidade e colocar a região em mercados de moda premium que hoje importam fibras especiais, como o algodão egípcio.
Camilo Morello, coordenador do Programa de Melhoramento Genético da Embrapa Algodão, detalhou as inovações da fibra premium em contato com o Investindo Por Aí. “Essa cultivar [BRS 700FL B3RF] visa suprir uma demanda por fibras de alta qualidade, com maior valor agregado… chegamos a uma qualidade de fibra bastante próxima, porém em algodoeiro herbáceo (Upland), preservando produtividade e sanidade”, explicou
Com comprimento médio de 33,5 mm (ultrapassando 34 mm em mais da metade das localidades de teste), resistência de 32,8 gf/tex e micronaire de 3,7, a BRS 700FL B3RF garante um rendimento médio de 4.524 kg/ha e 38% de fibra — números que aproximam o Brasil da cotonicultura premium.
Já a BRS 800 B3RF tem foco na sanidade e produtividade: resistente à ramulária, bacteriose, doença azul e nematoides de galhas, apresenta produtividade de 5.000 kg/ha, fibra com rendimento de 42% e ciclo precoce ideal para safrinha e sistemas sob pivô. Como destaca o pesquisador Nelson Suassuna: “A ramulária obriga maior número de aplicações de fungicidas… os nematoides causam drástica redução na produção, muitas vezes inviabilizando a lavoura”.
No campo, produtores do Nordeste relatam frequentes desafios: manejo constante contra o bicudo e tratamentos intensivos para controlar ramulária e infestação de nematoides. Um cotonicultor da Paraíba, que testou uma prévia das sementes, comentou:
“Cada aplicação de defensivo representa dias de trabalho intenso e gastos altos que corroem a margem, essas cultivares podem mudar esse cenário”.
No Cariri Cearense, o produtor José Morais Filho retoma a cotonicultura com tecnologia transgênica:
“Plantamos 50 hectares, com produtividade média de 2.500 kg/ha, utilizando semente transgênica com tolerância ao glifosato e resistente a lagartas. Isso nos levou a voltar a plantar algodão. Aqui temos muitos veranicos e o algodão é muito mais resistente que o milho”.
Embora a ABRAPA (que reúne cerca de 95% da produção nacional) ainda não tenha se manifestado oficialmente, cresce a expectativa de apoio para difusão das novas sementes entre os 18 mil produtores associados
O elo com o mercado têxtil premium também desperta esperança: pequenas fiações na Bahia e no Ceará já monitoram os primeiros lotes da BRS 700FL B3RF, vislumbrando uma fibra nacional com qualidade comparável à importada. Um fatureiro local comentou sob reserva que a chegada dessa matéria prima pode “diminuir importações e valorizar a cadeia produtiva regional”.
Os próximos passos definem-se na próxima safra: a Embrapa se preparará para conectar jornalistas à produtores que plantarão as cultivares ainda neste semestre, reivindicando dados reais sobre produtividade, economia de defensivos e qualidade da fibra em campo, essenciais para consolidar o algodão nordestino como opção premium.
Em resumo, as novas cultivares BRS 700FL B3RF e BRS 800 B3RF trazem um salto na cotonicultura do Nordeste, oferecendo uma combinação rara: fibra fina, longa, forte e uma lavoura menos dependente de defensivos. Se os testes confirmarem as expectativas, o Brasil pode, enfim, plantar e comercializar fibra de calibre internacional no semiárido nordestino.