Jornalismo econômico para a inovação no Nordeste -
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20 de março de 2025 11:54

Mulher empreendedora: um sonho ou uma realidade inescapável?

Mulher empreendedora: um sonho ou uma realidade inescapável?

A região Nordeste concentra 23% do total de mulheres empreendedoras do Brasil. É a segunda região com o maior índice de donas de negócio, atrás somente do Sudeste, com 44%
Foto: Tânia Rego

Se para muitos trabalhadores tirar um projeto do papel e ter o próprio negócio é um sonho, para a mulher brasileira, empreender é, em maioria, uma realidade que se impõe. De acordo com a pesquisa Mulheres Empreendedoras e Seus Negócios, realizada pela Rede Mulher Empreendedora (RME), mais da metade das empreendedoras são mulheres negras (60%), pertencem a classe C e D (74%), são mães (70%) e não possuem ensino superior (72%).

Quando levamos em conta o contexto das mães, empreender é uma realidade que se impõe duplamente, considerando que muitas mulheres são demitidas de seus postos de trabalho até dois anos do retorno da licença maternidade, o que gera um outro dado preocupante: praticamente todas as mulheres precisam fazer transição de carreira depois da maternidade. 

A região Nordeste concentra 23% do total de mulheres empreendedoras do Brasil. É a segunda região com o maior índice de donas de negócio, atrás somente do Sudeste, com 44%. As mulheres nordestinas, no entanto, apesar de representarem uma força produtiva importante para o país, tendem a ter negócios menores, menos formais e com níveis mais baixos de bem-estar. 

Os dados são do Panorama do Empreendedorismo Feminino no Brasil, uma produção feita em parceria pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC). 

O estudo destaca que a regionalidade no Brasil está fortemente relacionada com a raça.  

As mulheres brancas nas Regiões Sul, Centro-Oeste e Sudeste têm maior representação no conjunto de empreendedoras, em comparação com as Regiões Norte e o Nordeste.

“No Norte e no Nordeste, a perspectiva do empreendedorismo está mais presente em mulheres com níveis de educação mais baixos, o que pode estar relacionado à vasta existência de um empreendedorismo motivado pela necessidade nessas regiões e à baixa oferta de empregos formais para essas mulheres”, afirma a coordenadora da pesquisa, Raquel de Oliveira Alves. 

No que diz respeito ao acesso a crédito, as empreendedoras do Nordeste enfrentam mais restrições. Esta diferença não se encontra na comparação do gênero entre empreendedores das Regiões Sul, Sudeste e Centro Oeste.

A análise da pesquisa afirma que as desigualdades regionais podem ser uma consequência da discriminação de gênero no Nordeste e exigem políticas públicas que visem, especificamente, o empoderamento econômico das mulheres nordestinas em particular. 

Foto: Amitis

No Congresso Nacional, uma das parlamentares que está levando esse debate adiante é a deputada federal Juliana Cardoso (PT-SP). Para a deputada, o empreendedorismo não deve ser visto como saída para cidades adensadas, “mas como alternativa real em oportunidades que devem ser ofertadas às mulheres ou a qualquer cidadão pelo estado como fomentador de novos negócios.”

“Nos governos do PT na cidade de São Paulo foram elaborados planos de incentivos às empresas para se fixarem nas periferias. Na época da prefeita Marta Suplicy foi lançado o Programa de Desenvolvimento da Zona Leste que previa estímulos para isso. Mas esse programa não teve continuidade. O empreendedorismo é parte importante da engrenagem que faz rodar a economia, e precisamos de programas capazes de se tornarem políticas de Estado”, afirma a parlamentar.

Um programa, segundo Cardoso, com potencial para ser a base desse sistema é o Elas Empreendem, articulado pelo Ministério do Empreendedorismo, da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte em conjunto com o Ministério das Mulheres. O programa prevê facilitação de crédito, formação, e prioridade no atendimento a mulheres em situação de risco e vulnerabilidade. 

Por uma rede de apoio à empreendedora

O estudo da RME indicou que, para 41% das empreendedoras, a receita de suas empresas ainda não é suficiente para pagar as despesas do negócio. Já 35% dizem obter receitas satisfatórias para pagar as contas do empreendimento, mas apenas 11% têm a possibilidade de também poupar.

Parte dessa fotografia pode ser amortecida com linhas de crédito específicas para mulheres, com juros menores e condições de contrato que levam em conta as particularidades da vida da mulher trabalhadora. A falta de acesso a crédito é consenso como um dos principais entraves entre especialistas em empreendedorismo feminino.

A presidente do RME, Ana Fontes, conta ainda que as chances de um negócio são melhores quando a mulher começa com pequenos passos e atuando em áreas já conhecidas. 

“Ter uma rede de apoio especializada, uma comunidade envolvida nas mesmas questões, e uma mentora ou mentor para ajudar a superar as dificuldades dos três primeiros anos também podem ser cruciais para a sobrevivência da empresa”, afirma Ana.  

Cuidar do mundo como possibilidade de negócio

Na pesquisa da RME, quando perguntadas sobre quais propostas de políticas públicas mais impactam no seu voto, projetos para a área da Educação, como mais creches e escolas e acesso à universidade, e medidas para a geração de emprego e renda estão no topo da lista.

Empresas lideradas por mulheres são as que mais geram impacto positivo na sociedade. Em geral, elas investem mais na contratação de outras mulheres, dão melhores condições de trabalho e salário e investem na formação dos funcionários. Na esfera privada, a renda gerada por essas empresas é usada para a formação dos filhos, saúde e melhorias das condições de vida da família e da comunidade no entorno.

Foto: Agência Brasil/ Vinicius de Melo

É exatamente do desejo de atuar e impactar positivamente as pessoas ao redor, em especial as pessoas mais vulneráveis, que as irmãs gêmeas e sócias Lilian Vicente e Liliane Vicente, de 28 anos, criaram a Amitis, uma empresa radicada em Maceió, Alagoas, e que ajuda outras empresas com práticas de ESG. A dupla cria soluções de combate à fome, redução de desperdícios e promove segurança alimentar em espaços como escolas, pequenos territórios e dentro das próprias empresas. 

A ideia do negócio surgiu a partir de uma dura realidade. “Estávamos participando de uma ação de entrega de cestas básicas, quando uma senhora nos abordou e disse que lutava para alimentar toda a família com os restos de comidas que iam parar em um lixão, localizado próximo de onde ela morava. Aquilo nos arrebatou. Ficamos assustadas quando percebemos que a fome era uma realidade tão próxima nossa”, conta Lilian. 

A empresa consiste essencialmente em vender projetos que querem aplicar responsabilidade corporativa nas comunidades. São empresas que se movem ou pelo desejo de impactar positivamente, ou porque precisam compensar danos ambientais e sociais já causados na comunidade. 

Elas são jovens, líderes e comprometidas com tecnologia sustentável, uma demanda tão exigente hoje no mercado. Mas não se restringem em impactar apenas empresas e comunidade. A renda da Amitis é também responsável pela segurança financeira de boa parte da família das irmãs Vicente. 

“A nossa renda sustenta a maior parte da família. Nós sabemos a responsabilidade que temos. E temos consciência dos desafios de empreender sendo mulher. Já vivemos situações, principalmente no meio corporativo, dominado por homens, de desconfiança do nosso trabalho e da nossa capacidade, que não éramos vistas do tamanho que somos, por sermos mulheres”, conta a empreendedora. 

A jornada, muitas vezes, segundo as irmãs, é solitária. Elas compreendem que o empreendedorismo é mais debatido do que apoiado de fato. As dificuldades e o preconceito não impediu e não impede que a Amitis, sob as sócias cresça, impacte e seja um exemplo da força produtiva da mulher empreendedora. 

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