2025 trouxe novas perspectivas para a adaptação ao cenário de mudanças ambientais, impulsionadas por iniciativas concretas voltadas à sustentabilidade. Um dos marcos desse processo é a atuação do Consórcio Nordeste (CNE), que celebra cinco anos de integração entre os nove estados da região, consolidando políticas em setores diversos, entre elas, de desenvolvimento sustentável e combate às mudanças climáticas.
Entre as principais iniciativas promovidas pelo CNE, destacam-se o Fundo Caatinga, um instrumento financeiro voltado à preservação e recuperação do bioma, representado no incentivo ao “recaatingamento”, e a aposta no hidrogênio verde como alternativa para descarbonizar a economia. Além disso, projetos baseados em sistemas agroflorestais reforçam o compromisso com a sustentabilidade e a inclusão socioprodutiva das comunidades locais.
A secretária do Meio Ambiente do Estado de Pernambuco, Ana Luiza Ferreira, destaca que a cooperação entre os Estados do Nordeste tem sido fundamental para a implementação de políticas ambientais e turísticas na região. Segundo ela, um dos principais focos dessa parceria é a preservação da caatinga e do semiárido, biomas que desempenham um papel crucial na biodiversidade e no equilíbrio climático. “A caatinga é um bioma riquíssimo, mas ainda muito subestimado. Muitas vezes, a imagem que se tem é de um solo rachado, de escassez, quando, na verdade, é uma floresta viva, densa, com uma biodiversidade extremamente importante e ainda não reconhecida”, afirma.
Na segunda edição da série A (im)previsibilidade do tempo, do Portal Investindo Por Aí, analisamos as conquistas do Consórcio Nordeste e as projeções para os próximos cinco anos, explorando como essa integração política abre caminho para um novo modelo de desenvolvimento sustentável na região.
Além disso, consideramos os negócios que surgem na esteira dos fenômenos climáticos, com destaque para iniciativas de impacto, como o caso do Nosso Mangue que alia preservação ambiental e geração de renda para comunidades locais.
A primeira reportagem da série explorou os desafios do setor meteorológico diante do aumento de eventos climáticos extremos no Nordeste.
Planejamento de longo prazo
O CNE se tornou um dos principais agentes de articulação política e econômica da região. Agora, em seu quinto ano, o grupo reforça seu compromisso com o desenvolvimento sustentável ao aderir à Estratégia Brasil 2050, iniciativa conduzida pelo Ministério do Planejamento e Orçamento (MPO). O plano busca integrar setores e regiões, promovendo previsibilidade na gestão pública, melhora do ambiente de negócios e maior transparência.
Com metas voltadas à redução das desigualdades, enfrentamento das mudanças climáticas e crescimento sustentável, a estratégia orienta o desenvolvimento do país nas próximas décadas. O CNE tem papel fundamental nesse processo, sistematizando dados que auxiliarão na identificação de megatendências, na elaboração de cenários e na definição de ações estratégicas para o futuro da região.
A secretária ressalta que o Consórcio Nordeste tem direcionado esforços para fortalecer essa pauta ambiental, que se tornou uma das prioridades do bloco. “O consórcio foi criado em um contexto de calamidade na saúde pública, mas hoje enxergamos que a questão ambiental deve estar no centro das discussões”, reforça Ana Luiza.
A criação de um ecossistema robusto de conhecimento e inovação é outra frente importante para o avanço do Nordeste. O CNE propôs a implementação de três estruturas estratégicas para transformar a região em um polo de inovação e governança pública eficiente. Estas estruturas incluem:
O Observatório do Nordeste, destinado à análise e disseminação de dados estratégicos que servirão como base para a formulação de políticas públicas eficazes. Além do Laboratório de Inovação, que foca na modernização do serviço público e no desenvolvimento de soluções inovadoras para a gestão governamental. E para complementar a estrutura, a Escola de Governo, cuja missão é capacitar gestores e servidores públicos nas áreas de gestão pública, sustentabilidade e desenvolvimento regional integrado.
Essas iniciativas visam fortalecer a capacidade do setor público para enfrentar os desafios contemporâneos e impulsionar o desenvolvimento econômico e social da região.
Sustentabilidade e mudanças climáticas: avanços e desafios
O CNE tem se destacado no cenário nacional por seu compromisso com a sustentabilidade, uma das questões mais desafiadoras e transversais do desenvolvimento regional. O consórcio busca integrar as três dimensões da sustentabilidade — econômica, ambiental e social — em suas políticas públicas, visando um desenvolvimento equilibrado e inclusivo para todos os nordestinos. Entre as principais iniciativas em andamento, destacam-se:
- Fundo Caatinga: um mecanismo financeiro voltado à preservação e recuperação do bioma, com foco no “recaatingamento” de áreas degradadas;
- Hidrogênio Verde: investimentos em uma matriz energética limpa com o objetivo de descarbonizar a economia nordestina e contribuir para a transição energética.
Em setembro de 2023, uma parceria com o Banco Mundial foi firmada para desenvolver a cadeia produtiva de H2V na região, posicionando-a como um polo global de energias renováveis. Esse compromisso foi reafirmado com a “Carta de Natal”, que destaca a importância do Nordeste para mitigar os impactos das mudanças climáticas e avançar na produção de hidrogênio verde.
As discussões no World Hydrogen Summit, em Roterdã, em 2024, consolidaram o potencial da região em projetos de energia renovável, incluindo o Fundo Caatinga.
Para Ana Luisa, a resiliência da caatinga diante de condições extremas de temperatura e seca pode ser um diferencial estratégico. “Esse bioma já lida com temperaturas elevadas e escassez hídrica de forma natural, o que significa que há muito a se aprender com ele. A forma como a vegetação se adapta, como as árvores produzem seiva e armazenam água, tudo isso pode trazer soluções para outras regiões do planeta”, considera.
Entre as ações concretas desenvolvidas pelo Consórcio Nordeste, a secretária cita a criação de modelos de unidades de conservação adaptados à realidade da caatinga, respeitando os modos de vida das comunidades tradicionais e da agricultura familiar. “Muitas dessas populações vivem há séculos na região e possuem técnicas de cultivo que não agridem o meio ambiente. Precisamos fomentar essas práticas e evitar que o desmatamento avance, pois, quando removemos a vegetação nativa, aumentamos significativamente o risco de desertificação”, explica.
Um dos projetos mais relevantes nesse contexto é o programa Sertão Vivo, que visa implementar tecnologias sociais de reuso de água e técnicas de agricultura de baixo carbono. “Esse programa foi uma grande vitória do Consórcio Nordeste e conta com o apoio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA). Apenas em Pernambuco, serão investidos R$300 milhões em ações para garantir a convivência sustentável com o semiárido”, enfatiza Ana Luisa.
Ana Luisa também enfatiza que a transição energética e a busca por fontes renováveis são fundamentais para o futuro da sustentabilidade na região, e destaca o potencial do hidrogênio verde como uma alternativa promissora. “O Nordeste tem uma das melhores condições do mundo para a produção de hidrogênio verde, graças ao nosso potencial de energia eólica e solar. Isso nos coloca em uma posição estratégica para liderar essa nova economia sustentável”, afirma.
A secretária ressalta que Pernambuco já está se preparando para essa nova matriz energética, atraindo investimentos e promovendo estudos sobre a viabilidade da produção em larga escala. “Estamos trabalhando para criar um ambiente favorável ao desenvolvimento desse setor, garantindo infraestrutura e capacitação profissional para que o hidrogênio verde se torne uma realidade no Estado”, pontua.
Preservação ambiental impulsiona setores como o turismo
Além da preservação ambiental, a secretária ressalta que essas iniciativas também têm impacto direto no desenvolvimento econômico e no turismo sustentável da região. “A conservação da caatinga não é apenas uma questão ambiental, mas também econômica. Com a valorização do bioma, criamos oportunidades para o ecoturismo, atraímos investimentos e promovemos a geração de renda para as comunidades locais”, destaca.
Exclusivo: ecoturismo no Nordeste fomenta desenvolvimento regional
Ana Luisa menciona ainda que o turismo sustentável tem sido um dos pilares das políticas ambientais do Estado, com ações voltadas para o fortalecimento de trilhas ecológicas, observação da fauna e flora e incentivo a práticas de turismo de base comunitária. “Temos visto um crescimento no interesse de visitantes que querem conhecer a caatinga de perto, entender sua biodiversidade e vivenciar a cultura local. Precisamos transformar isso em um motor de desenvolvimento sustentável para a região”, considera.
Negócios sustentáveis: oportunidades na esteira das mudanças climáticas
Muito se fala sobre os impactos negativos das mudanças climáticas, e de fato, setores como a infraestrutura urbana, a agricultura, o comércio e os serviços estão sofrendo as consequências de eventos climáticos cada vez mais extremos. No entanto, o que os movimentos que enfrentam as mudanças climáticas têm feito para mitigar esses impactos?
Com o avanço das iniciativas sustentáveis, novos modelos de negócio têm surgido no Nordeste. Um exemplo é o Nosso Mangue, um empreendimento que une conservação ambiental e impacto social positivo. O projeto aposta no uso sustentável dos recursos costeiros e na valorização das comunidades locais.
O Nosso Mangue nasceu a partir da história de Mayris Nascimento, uma jovem ambientalista cujo sonho sempre foi “ser a mudança que deseja ver no mundo” (Mahatma Gandhi). Moradora do Pontal da Barra e de uma família de pescadores, Mayris sempre procurou participar de ações ambientais em seu bairro, com o foco de ajudar o próximo e o meio ambiente no qual está inserida.
“O surgimento do negócio de impacto ocorreu com o propósito principal de devolver à natureza o que ela já havia feito pela minha família, que, por muitas vezes, não tinha o que comer e encontrava na laguna e no manguezal o seu alimento e fonte de renda”, explica Mayris Nascimento. Nesse contexto, o objetivo era restaurar e preservar os ecossistemas de manguezais, que são fundamentais tanto para a biodiversidade quanto para o combate aos efeitos das mudanças climáticas, como a elevação do nível do mar e a erosão costeira.
“No início, o principal desafio foi o aspecto econômico para manter o modelo de negócio, além da conscientização da população local e das autoridades sobre a importância de preservar os manguezais, e a busca por formas práticas e eficientes de recuperar áreas degradadas”, relembra Mayris.
Mas com os desafios, surgem aprendizados, a fundadora do Nosso Mangue diz que um dos maiores aprendizados foi entender que a solução para os problemas ambientais não está apenas em ações técnicas, mas também em trabalhar a educação ambiental e o engajamento das comunidades locais, compreendendo a importância e a valorização do saber tradicional, aliado ao conhecimento científico.
Mayris destaca que o Nosso Mangue atua diretamente na recuperação e preservação dos manguezais, que são ecossistemas altamente eficientes na captura de carbono, ajudando a mitigar as emissões de gases de efeito estufa. “Além disso, os manguezais protegem as áreas costeiras da erosão e do avanço do mar, oferecendo uma barreira natural contra desastres ambientais, como tempestades e tsunamis”, ressalta.
Dessa forma, as ações do projeto não se limitam à restauração ecológica. “Elas também incluem o fortalecimento da economia local por meio do turismo regenerativo e da capacitação de comunidades para atividades que respeitem e valorizem a natureza, como a coleta sustentável de propágulos de mangue, a produção de mudas, a logística de embarcações e a pesca responsável”, reforça Mayris.
O modelo de negócio do Nosso Mangue se baseia em uma combinação de fontes de financiamento, incluindo parcerias e contratações com empresas e governos, além de recursos obtidos por meio de doações e premiações.
“A ideia é garantir que os serviços de preservação, recuperação e compensação da pegada de carbono possam ser autossustentáveis a longo prazo, gerando receita tanto para o negócio de impacto quanto para as comunidades envolvidas. Além disso, parte dos recursos é destinada à educação e sensibilização ambiental, garantindo que as futuras gerações possam dar continuidade à missão do Nosso Mangue”, considera Mayris.
Com a sustentabilidade do negócio garantida, os próximos passos do Nosso Mangue estão bem definidos e envolvem expandir suas ações para outras áreas costeiras do Brasil, com foco em regiões que enfrentam altos índices de degradação ambiental. “Estamos também explorando novas parcerias com empresas de tecnologia para integrar soluções inovadoras de monitoramento remoto e inteligência artificial, o que permitirá uma gestão mais eficiente e a escalabilidade das ações de restauração e compensação da pegada de carbono”, revela Mayris.
“Além disso, o Nosso Mangue tem planos de fortalecer seu modelo de turismo regenerativo, oferecendo experiências imersivas que educam as pessoas sobre a importância da preservação dos manguezais, ao mesmo tempo em que geram renda para as comunidades locais”, conclui.