Geleia, licor, compota açucarada, xarope, suco. O umbu, fruto de casca esverdeada e polpa farta típico do sertão nordestino, tem ganhado, ano a ano, novas formas de processamento pelas mãos de pequenos produtores, e já é presença cativa na mesa de muitos brasileiros. Agora, a partir de um estudo realizado pela Embrapa, a fruta revela potencial para uma forma mais elaborada de consumo: o espumante.
Estudo realizado pela Embrapa em colaboração com cientistas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) usou o umbu como matéria-prima para a elaboração de bebida alcoólica fermentada e naturalmente gaseificada, do tipo vinho espumante.
A inovação foi desenvolvida pelos pesquisadores junto da Cooperativa Agropecuária Familiar de Canudos, Uauá e Curaçá (Coopercuc), localizada no semiárido baiano, entre os anos de 2020 e 2024, que teve como objetivo extrair do umbu um produto com alto valor agregado.
A pesquisadora responsável pelo estudo, Aline Biasoto, explica que, a princípio, foram produzidas dois tipos de bebidas alcoólicas: uma sem a gaseificação, mais próxima do vinho, e uma com a gaseificação, similar ao espumante.
“Fizemos os testes de consumo com as duas, mas o tipo gaseificada tem melhor aceitação, por ser um tipo de bebida tida como mais fresca, com mais ad
erência ao público brasileiro. Para nossa surpresa, não foi necessário grande adição de açúcar. Os testes com os potenciais consumidores mostraram que a bebida é muito bem aceita mesmo na sua forma mais pura possível”, afirma.
A inovação usou o método tradicional de produção de espumantes, também conhecido como método Champenoise, caracterizado por duas fermentações, sendo a segunda na garrafa.
O método é originário da região francesa de Champagne e é utilizado também para produzir os espumantes Cava, na Espanha, e Franciacorta, na Itália, e é considerado um dos mais artesanais e, por isso também, dos mais saborosos.
Biasoto explica que a forma de produção artesanal, além de conferir mais sabor e qualidade à bebida, foi escolhida por ser facilmente reproduzível pelas cooperativas e pequenos produtores, uma vez que não exige ferramentas e maquinários mais complexos.
A árvore sagrada do Sertão
Popularizada como “árvore sagrada do Sertão” pelo escritor Euclides da Cunha, o umbuzeiro, originário dos chapadões do semiárido brasileiro, tem grande resistência às secas da caatinga, e é uma importante fonte de renda e de nutrição para milhares de famílias sertanejas.
A fruta é uma das principais fontes de vitamina C no semiárido. É rico em vitaminas A, C, e B1, cálcio, ferro, fósforo, proteínas, carboidratos e niacina. Embora o umbuzeiro seja uma árvore longeva e resistente, o umbu é uma fruta perecível, e pode sofrer grande perda nas colheitas.
Por isso, o uso para a produção de bebida similar ao vinho espumante é uma estratégia de agregação de valor e diminuição das perdas, capaz de atrair consumidores interessados em bebidas inovadoras com matérias-primas alternativas.
“A inovação poderá contribuir para a melhoria da economia circular em uma das regiões mais afetadas pela escassez de água, fortalecendo a agricultura familiar e extrativista no bioma Caatinga”, afirma a pesquisadora da Embrapa.
Ela chama atenção, no entanto, que a bebida criada não pode ser considerada um espumante propriamente. Isso porque para ser chamada de espumante a bebida precisa necessariamente ser produzida a partir da uva. É o caso da cidra, bebida cujo processo de produção é o mesmo do espumante – fermentação e gaseificação natural -, mas feita com maçã, e por isso batizada com nome próprio.
Caso a bebida elaborada pelos pesquisadores ganhe o interesse dos produtores, deverá ganhar um nome próprio de bebida para que tenha, assim como o espumante e a cidra, apelo comercial. “No gosto dos consumidores nós garantimos que ela já caiu”, brinca a responsável pela criação da bebida exótica.
Esta matéria integra a série especial Mercado de bebidas no Nordeste: tradição, inovação e experiência autêntica apresentada pelo Investindo Por Aí. A primeira, sobre o fortalecimento do enoturismo em Pernambuco, pode ser acessada por meio deste link, enquanto a segunda, sobre cerveja artesanal criada no semiárido baiano, pode ser lida aqui.